Paterno

Longa de Marcelo Lordello, chegou aos cinemas no início de agosto

Por: Mariana Mourão
Foto:
Helder Tavares

Em Paterno, Marcelo Lordello mergulha nas camadas de um drama familiar que se expande para um comentário social agudo, mantendo a tradição do cinema pernambucano de tensionar o íntimo e o político. O filme, estrelado por Marco Ricca, Gustavo Patriota e Thomás Aquino, não se contenta em contar a história de um homem dividido entre herança e afeto; ele investiga como as estruturas de poder, de classe e de memória se infiltram nas relações mais próximas.


O protagonista Sérgio, vivido por um Marco Ricca contido e minucioso, é um arquiteto à beira de duas perdas simbólicas: a do pai, cujo legado busca preservar, e a do filho, prestes a atravessar a ponte para a vida adulta. Essa trama pessoal se choca com um projeto imobiliário em Recife — e com a resistência dos moradores de uma área popular. Aqui, Lordello mostra o que melhor sabe fazer: transformar o embate de vontades em um território fértil para explorar contradições éticas e afetivas.

A fotografia de Bárbara Alvarez banha a cidade com uma luz que ora abraça, ora expõe, dialogando com a arquitetura real e simbólica do filme. O desenho de som, assinado por Nicolau Domingues, constrói uma paisagem auditiva onde o silêncio pesa tanto quanto as falas — reforçando o clima de tensão latente.

Se o roteiro — escrito por Lordello, Fábio Meira e Letícia Simões — mantém um ritmo deliberadamente cadenciado, é para permitir que o espectador absorva as zonas de silêncio, os olhares que dizem mais que diálogos, as pausas que carregam decisões irreversíveis. O tempo estendido não é gratuito: ele ecoa a lentidão burocrática, o desgaste das negociações e a corrosão progressiva das relações.

O elenco secundário, com nomes como Selma Egrei, Fabiana Pirro e Germano Haiut, amplia a força dramática da obra, oferecendo contrapontos humanos a um protagonista que oscila entre pragmatismo e afeto.

“Paterno” não é um filme de respostas fáceis — e tampouco pretende ser. Ele questiona o que realmente herdamos: bens e tradições ou a responsabilidade de repensar o que perpetuamos. Ao final, o que fica é um incômodo necessário, prova de que Lordello continua fiel ao cinema que provoca mais do que consola.

É um longa que dialoga com a maturidade de um cineasta em plena consciência de seu olhar — e que reafirma o cinema pernambucano como um dos espaços mais potentes da dramaturgia contemporânea brasileira.

Vá ao cinema!